terça-feira, 5 de outubro de 2010

A sala de aula na visão dos professores

Texto publicado no blog Foco em Gerações.

Semanas atrás eu publiquei posts contendo entrevistas de dois adolescentes falando sobre a sala de aula. O primeiro adolescente se mostrava completamente arredio com o ambiente, enquanto o segundo era mais motivado, apesar de também tecer severas críticas em relação à universidade.

Leia em “A sala de aula vista por um adolescente - Entrevista 1” e “A sala de aula vista por um adolescente - Entrevista 2".

As entrevistas foram publicadas na íntegra, sem que eu mudasse palavras ou amenizasse frases. Fui cauteloso em afirmar que não poderíamos generalizar, pois eram apenas dois estudantes apresentando suas percepções individuais.

O que me surpreendeu foi, nas semanas seguintes, receber e-mails de professores que leram as entrevistas e decidiram me enviar feedback, a maioria para reclamar da falta de interesse dos alunos e da dificuldade de conduzir as aulas neste contexto. Reuni o que achei de mais relevante nos e-mails e preparei o resumo abaixo. Todos me pediram confidencialidade, inclusive das instituições onde lecionam, mas aceitaram que eu fizesse esta síntese.

De maneira geral, os professores afirmam que as transformações no ambiente da sala de aula estão apenas começando. As novas tecnologias, a evolução cultural, os novos valores, o interesse pelo trabalho e a família já estão provocando mudanças profundas no processo de educação que conhecemos hoje. Todos falaram que as salas virtuais (ensino a distância) vão aumentar muito futuramente e que talvez não fará mais sentido obrigar os alunos a irem todos os dias para uma escola física.

A facilidade de acesso à informação, através dos gadgets que temos hoje em mãos e o que ainda vem por aí, deverá mudar o velho conceito da exigência de memorização e os atuais testes em sala de aula. Estas transformações, e muitas outras, vão exigir uma nova formação profissional para os professores, com nova mentalidade, mais recursos e mais tecnologia.

Os próprios professores dizem que não estão preparados para este mundo novo e nem se sentem em condições de iniciar esta transformação. As barreiras são muitas: as universidades estão mal preparadas, o corpo docente é arredio a mudanças e experiências, faltam recursos, existe desconhecimento no uso e aplicação das novas tecnologias e, principalmente, falta tempo para desenvolverem e implementarem coisas novas. Falta tempo para pensar diferente. A sensação é de que os professores estão sempre correndo e devendo alguma coisa. Eles não têm tempo para se desenvolver adequadamente.

Apesar do cenário acima, o grande desafio parece ser mesmo lidar com os alunos. Os professores dizem que uma grande parte deles não quer saber de nada, estão na sala de aula por obrigação e não por interesse próprio. A situação parece pior nas universidades que possuem wireless, pois a maioria diz que tal facilidade atrapalha mais do que ajuda.

Muitos me disseram que conseguem dividir a classe em duas metades, uma que não quer nada e a outra que se mostra interessada, que interage e busca aprender. A dificuldade é conciliar os dois grupos, que convivem no mesmo espaço, durante várias horas, todos os dias. Parece ser uma queda de braço diária.

Alguns usam powerpoint na sala de aula em vez de giz e a velha lousa. Tipicamente, os professores de marketing, publicidade e comunicação usam mais recursos audiovisuais. Já os professores de engenharia, matemática e administração, especialmente os tradicionais, ainda usam o método antigo, mas nenhum professor me disse que usar tal recurso gera mais interesse e atenção, uma coisa parece não ter relação com a outra.

O feedback recebido dos professores condena sumariamente o aluno da primeira entrevista. Eles alegam que não ficam desligados durante a aula e que se mantêm atentos e dedicados. Alguns alegam existir um problema de educação e falta de bom senso dos alunos, como atender ao celular ou colocar o pé em cima da mesa durante a aula.

Alguns dos professores confessaram ter obsessão por descobrir trabalhos que foram copiados e não admitem tal conduta. Mas, infelizmente, parece que esta prática está aumentando, e a alternativa tem sido evitar repetir trabalhos de períodos anteriores, impossibilitando-a.

Combinando o feedback dos professores com as entrevistas dos alunos, conclui-se que ninguém está satisfeito com a sala de aula. E quando ninguém está satisfeito…

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3 comentários:

Ana Manssour disse...

Por essas e outras - muitas outras - é que desisti de lecionar na graduação.

Há, ainda, um ranço de "antigamente" nas universidades que simplesmente não faz sentido e não condiz com a realidade. Desde fazer chamada em todos os períodos de aula (se são 4 períodos, são 4 chamadas), até turmas presenciais de 120 alunos em sala.

Só para exemplificar, se fizer chamada nos 4 períodos de 120 alunos, só aí perdeu-se quanto tempo de aula? Por outro lado, quem não quer ficar em sala, faz um grande favor aos professores e demais colegas se não vier ou se retirar.

Ninguém deveria ser obrigado a estudar e aprender. Esse é o começo de tudo! Primeiro, tem que ter a vontade, o interesse. Em seguida, as aulas e os métodos precisam ser atraentes e motivadoras de maneira a envolver o pretenso aluno no prazer de aprender e interagir com o conhecimento.

Mas, claro, para chegar aí, é prioritário que os alunos tenham tido uma boa educação em casa; que saibam respeitar colegas e professores, que não sejam agressivos, que não se julguem os senhores da universidade, do curso e do corpo docente. Também deveriam ter tido um ensino fundamental e médio de qualidade que lhes permitisse chegar ao nível superior sem escrever "voçê" ou trocar "mas" por "mais", entre outras coisinhas básicas.

E, os professores que inovam, que criam novas metodologias e não são reconhecidos pelos coordenadores e diretores? Que como "prêmio" têm suas horas-aulas (e portanto a remuneração) reduzidas, e ainda são presenteados com turmas cada vez maiores?

E o MEC que não fiscaliza o número de alunos em sala - que pela Lei das Diretrizes e Bases não deveria ultrapassar 50 - e continua fazendo as avaliações da qualidade dos cursos com base em formação dos professores e produção científica (entre outros dados) sem levar em conta a qualidade da aula dada por eles nem o fato de eles não terem tempo para a "tal" produção científica? De que jeito se os professores passam dias e noites planejando aulas, elaborando exercícios, atualizando-se e trazendo para a turma o que está ocorrendo no mundo, corrigindo infinidades de trabalhos e provas (provas sempre exigidas como forma de avaliação nas instituições de ensino)?

Lamentável. E nada que possa ser solucionado em dez anos. Talvez em vinte, quem sabe...

Ana Manssour disse...

Por essas e outras - muitas outras - é que desistimos de lecionar na graduação.

Há, ainda, um ranço de "antigamente" nas universidades que simplesmente não faz sentido e não condiz com a realidade. Desde fazer chamada em todos os períodos de aula (se são 4 períodos, são 4 chamadas), até turmas presenciais de 120 alunos em sala.

Só para exemplificar, se fizer chamada nos 4 períodos de 120 alunos, só aí perdeu-se quanto tempo de aula? Por outro lado, quem não quer ficar em sala, faz um grande favor aos professores e demais colegas se não vier ou se retirar.

Ninguém deveria ser obrigado a estudar e aprender. Esse é o começo de tudo! Primeiro, tem que ter a vontade, o interesse. Em seguida, as aulas e os métodos precisam ser atraentes e motivadoras de maneira a envolver o pretenso aluno no prazer de aprender e interagir com o conhecimento.

Mas, claro, para chegar aí, é prioritário que os alunos tenham tido uma boa educação em casa; que saibam respeitar colegas e professores, que não sejam agressivos, que não se julguem os senhores da universidade, do curso e do corpo docente. Também deveriam ter tido um ensino fundamental e médio de qualidade que lhes permitisse chegar ao nível superior sem escrever "voçê" ou trocar "mas" por "mais", entre outras coisinhas básicas.

E, os professores que inovam, que criam novas metodologias e não são reconhecidos pelos coordenadores e diretores? Que como "prêmio" têm suas horas-aulas (e portanto a remuneração) reduzidas, e ainda são presenteados com turmas cada vez maiores?

E o MEC que não fiscaliza o número de alunos em sala - que pela Lei das Diretrizes e Bases não deveria ultrapassar 50 - e continua fazendo as avaliações da qualidade dos cursos com base em formação dos professores e produção científica (entre outros dados) sem levar em conta a qualidade da aula dada por eles nem o fato de eles não terem tempo para a "tal" produção científica? De que jeito se os professores passam dias e noites planejando aulas, elaborando exercícios, atualizando-se e trazendo para a turma o que está ocorrendo no mundo, corrigindo infinidades de trabalhos e provas (provas sempre exigidas como forma de avaliação nas instituições de ensino)?

Lamentável. E nada que possa ser solucionado em dez anos. Talvez em vinte, quem sabe...

Anônimo disse...

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