quarta-feira, 22 de julho de 2009

1969: O mundo estava na Guerra Fria enquanto minha cabeça estava na Lua

Texto publicado no blog Foco em Gerações que reproduzo abaixo.

Lembro que há alguns anos, num treinamento gerencial, o instrutor pediu para que cada participante trouxesse consigo uma imagem que tivesse marcado a adolescência e que ainda continuasse na mente. A maioria levou fotos da família, da primeira namorada ou namorado, do cachorro e até da escola. Eu fui o único que levou a imagem da pegada do primeiro homem na Lua.

Eu tinha exatos 9 anos quando o Neil Armstrong pisou na Lua pela primeira vez. Aquilo parecia um sonho. Eu ficava olhando a Lua, tentando ver a silhueta do homem que naquele momento estava por lá. Passei parte da minha infância sonhando em ser astronauta, adorava brincar de foguete e estudava astronomia. Eu sabia de cor e salteado os nomes das luas de Saturno, os nomes das galáxias no céu e todas as missões lunares.

Nem passava pela minha cabeça que a corrida espacial não era algo somente idealista e desbravador. Era, na verdade, uma das frentes da intensa batalha política e militar entre americanos e soviéticos. O mundo estava na Guerra Fria enquanto minha cabeça estava na Lua. Meu interesse pelo assunto foi despertado quando li que a URSS tinha enviado, em 1957, o primeiro ser vivo para o espaço. Era a cadela Laika. Na minha imaginação, eu pensava numa cadela linda, entrando na aeronave espaçosa, com o rabo abanando de alegria e voltando do espaço, feliz, para o seu dono. Somente décadas depois é que fui descobrir que a Laika foi enviada pelos soviéticos para morrer no espaço. Ela embarcou numa cápsula super-apertada, numa viagem sem volta, já programada dessa maneira. Não foi acidente. Essa era a missão. Enfim, ela era uma mártir e eu não sabia.

Na minha cabeça de hoje, a pegada lunar é a imagem de um tempo onde eu sonhava. Sonhava com um mundo diferente, num futuro distante e quase inatingível. Depois que virei adulto, a vida e a dura realidade cuidaram para eu guardar essa imagem no fundo do baú da minha memória.

A imagem da pegada lunar voltou a tona nesse mês de julho, quando todas as mídias ainda comemoram os 40 anos da conquista da Lua. A foto da marca deixada pela bota de Armstrong inundou todos os jornais e me fez sonhar de novo, mas só um pouquinho, é verdade.

Tenho a impressão que a juventude dos dias de hoje sonha pouco. São menos idealistas e, talvez, mais tristes. Será mesmo? Quando sonham, o futuro sonhado é mais próximo e pragmático. É um futuro quase imediato. O mundo apressado, conectado, online, com abundância e acesso fácil à informação faz a gente não se desgrudar da realidade. Quando a gente começa a sonhar, aparece algum torpedo de SMS ou twitter para fazer a gente pousar de novo na Terra. Ou seja, o módulo lunar não decola rumo ao seu destino. No mundo atual, certamente eu não levaria décadas para saber que a Laika decolou rumo à sua morte. Talvez alguns minutos.

Na minha infância, eu brincava nos terrenos baldios, nas praças e nos parques. Era lá que encontrava meus amigos e falávamos da vida. Era sempre a mesma turma. Quase sempre jogando futebol com bola murcha e tênis velho, as vezes jogando bolinha de gude. Viajar era algo especial e, quase sempre, inesquecível.

A infância de hoje é repleta de tecnologia. Os orkuts e redes sociais são os terrenos nada baldios de hoje. Falamos com um número enorme de pessoas que não conhecemos e que, muitas vezes, são chamados de amigos após poucas horas de relação virtual. Joga-se games tecnológicos o tempo topo. E viajar… bem, viajar, é algo que fazemos quase todos os dias na internet. Estamos o tempo todo descobrindo o desconhecido na rede. O mundo perdeu suas fronteiras.

Por favor, não entendam mal. Eu não estou afirmando que o mundo de hoje é pior que antigamente. Longe disso. Acho que vivemos num mundo mais democrático e mais consciente de suas mazelas e desafios. Mas não posso deixar que senti, dias atrás, ao ver a imagem da pegada da lua, que o mundo está menos sonhador.




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4 comentários:

Zee Lima disse...

Bom dia!

Inspirador, ou seria sonhador, o post! Me lembro de quando era "moleque" (hehehe) dos góticos e seu romantismo/Byronianismo envolto em sepulturas, sons guturais...

Hoje nós temos os Emos, que se refastelam numa tristeza, abandono.. enfim, nós que hoje estamos com 30 e poucos anos somos os pais deles.

Sõ nossos filhos que estão por ai. E concordo contigo quando diz que hj se sonha menos... pois muitos de nós confunde sonho com delírio, alucinação, loucura...

E é isso que estamos passando para nosso filhos. Em vez de ajudarmos eles a pensarem mais, a irem mais longe, estamos os envolvendo em nossos delírios oitentistas...

Uma pena, mas foi exatamente o que aconteceu com as gerações anteriores as nossas. A caravana sempre passa, e os cães sempre latem.

;D

Dienes disse...

é infância, eu ainda pude, brincar de bola, pega-pega, quando os país sentavam na frente de suas casas e seus filhos brincavam até às 9h da noite. A questão de sonhar, apesar de achar que você tem razão, fico com pé atrás porque acredito que o ser humano apenas da valor aquilo que já passou, juventude nunca é a mesma e nem os sonhos, aposto que seus pais achavam que no tempo deles é que era bom! eu, com 20 e poucos anos acho que minha infância foi muito boa e acredito que minha juventude está sendo ótima, mas não sei, é apenas a minha opinião...

Pucci disse...

Eu diria que a questão aqui é aonde esses meninos vão chegar? Estão tendo relações cada vez mais superficiais, suas vontades são atendidas a todo o momento. Onde está o amadurecimento, crescimento, desenvolvimento pessoal?

O que me chateia tanto na sua analise quanto na da M.S. é que se isto foi levado em conta por uma empresa renomada e publicado, evidencia que o desenvolvimento pessoal não é o foco. Parece que é interessante, "legalzinho", porém ninguém pensou sobre as conseqüências desse futuro ser humano. Foi analisada apenas a questão mercadológica.
Então vou expressar meu ponto de vista humanista/comportamental:
‘’Falamos com um número enorme de pessoas que não conhecemos e que, muitas vezes, são chamados de amigos após poucas horas de relação virtual. ‘’
==> Tem nome isso. Superficialidade. Pode chamar esta pessoa de “sem a devida noção de como lidar com os sentimentos”. Pense comigo: Você na sua época fez isto também. Nos tempos do terreno baldio e da pipa. Conheceu uma pessoa que achou que era sua amiga depois de 10 minutos. E você foi amadurecendo (quebrando a cara) e passou a definir amigo e colegas como coisas diferentes. Ou seja, existe ai o atrito. O cara a cara. A decepção. SENTIMENTOS, que você viveu o tempo necessário pra entender e nomea-los. Então hoje, o terreno baldio foi substituído pelo terreno virtual. Um terreno sem métodos, sem leis. No baldio não tem conversa. Alguém te jogou uma mamona? Dói. Tropeçou e ralou o joelho no chão? Vai arder até. Principalmente quando for tomar banho. Brigou? Você pode até ser o vitorioso que bateu no outro. Mas sua mão vai doer na hora que você der o soco. Você vai senti-la. No virtual a coisa muda. Te aborreceu? Xzinho nele. Exclui ele. Apaga, bloqueia. Muda de site. Logo você arruma outra coisa pra fazer e lá se foi aquele tempo que você passava horas remoendo e pensando sobre o que aconteceu, analisando. Tentando ver como poderia ter agido melhor e conseqüentemente aprendendo a lidar com seus sentimentos/sensações.
Quando a gente começa a sonhar. A entrar em contato com as nossas questões, parar para olhar para si mesmo. Vem um sms ou twitter e acabamos evitando o contato com nossos sentimentos/sensações. O seu sonho de ir à lua não aconteceu. Mas te fez questionar, te fez pensar. Pensar no que você queria ser, no que fazer da vida. Quando você "sonhou", pensou em você, estava ligado no seu futuro. Mesmo que de forma lúdica como as crianças agem. Ao dizer que os sonhos hoje são mais imediatistas, enxergo uma dificuldade de abstração, dificuldade de programar algo distante, enfrentar dificuldades por um bem maior.

Pucci disse...

Continuação:

Sabe, a humanidade tem evoluído e criado facilidades para que saíssemos do braçal e tivéssemos um tempo maior dedicado as questões mentais. No geral, ao fazer uma tarefa braçal estamos mais ligados na atividade do que no pensamento. Hoje isto mudou. Antigamente se eu quisesse visitar o Vale do silício teria que me locomover até lá. De navio, passaria um enorme tempo num ambiente diferente, acordando, comendo e dormindo dentro de um barco. De avião com diversas pessoas diferentes ao meu lado. Nestas épocas, a sociedade impunha certas regras, existia um inconsciente coletivo do que se podia e não se podia fazer. A sociedade também educava. Ao passar dias dentro de um navio, as mascaras caiam. A paciência se esgotava. Logo uma pessoa inconveniente seria colocada no seu devido lugar no âmbito social. Já num avião a viagem é mais rápida. As vezes não compensa o atrito. Logo você estressado pensa - Pra que? Daqui a 2 horas o vôo termina e pronto.
Hoje acesso sites com qualquer conteúdo e faço o que eu quiser. Não sou saudosista. Sou a favor deste novo tempo. Só que vejo pessoas sem objetivo de vida. Sem sequer parar pra pensar nisto. O pai e a mãe passam menos tempo com os filhos enquanto que neste novo modelo de sociedade, eles são até mais necessários do que se pensa. É claro! Tinha me esquecido. O foco do mundo continua sendo na produtividade!
Mas isto já vem mudando. As empresas mais preocupadas com o comportamental. Até uma busca pela conservação do ambiente. Mesmo com um alto desenvolvimento e várias ferramentas de produtividade, a base do ser humano é a mesma. Entretanto poucas pessoas trabalham a base comportamental/relacional. Funciona da mesma forma de um prédio. Quanto mais forte a base. Mais alta a cobertura.

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