Luiz é recrutador da empresa XYZ. Ele estava com a responsabilidade de contratar um determinado especialista para a empresa e, de repente, após 6 meses de longa busca no mercado, chegou em suas mãos um currículo que parecia ser a salvação da lavoura.
O candidato se chamava Eduardo. O currículo mostrava um nível super adequado de formação. Ele tinha experiência internacional, tendo atuado em duas empresas na Europa. Eram experiências curtas, é verdade, mas significativas. Eduardo se dizia autoditada, com disponibilidade para viajar bastante, capacidade para liderar times multifuncionais, sólido conhecimento em planejamento e perfil empreendedor.
Luiz pensou: "Ótimo, agora só falta uma coisa". E seguiu para o passo seguinte que era verificar a presença do candidato na internet. Isso agora é rotina na empresa de Luiz. Ele constatou que Eduardo era contribuidor de dois blogs nos quais escrevia sobre as áreas em que atua, sempre com boas e inteligentes colocações. Luiz sorriu, o candidato parecia perfeito. Porém, em questão de minutos, ele também descobriu que Eduardo tinha presença em vários outros meios na web. No Facebook, Eduardo contava as suas aventuras nas baladas da noite surgindo em algumas fotos com bebida alcoólica nas mãos, algumas delas em que ele parecia estar bêbado. No Twitter ele escrevia sobre qualquer coisa, muitas vezes usando palavrões e satirizando o comportamento de pessoas públicas, como artistas e políticos. Vasculhando um pouco mais, Luiz encontrou citações dele em alguns blogs e fóruns onde ele falava mal do empregador, inclusive contando alguns fatos internos das empresas onde trabalhou.
Luiz apresentou na empresa o currículo e o que achou na internet sobre o candidato. Aconteceram três reuniões sobre o caso, com discussões acaloradas, cuja conclusão foi a seguinte: "apesar do candidato ter o perfil profissional desejado, ele não atende ao perfil de pessoas que queremos ter dentro da empresa. Vamos continuar procurando outros candidatos".
Luiz telefonou ao candidato e explicou o ocorrido, falando com todo o tato possível. Eduardo alegou que a empresa investigou sua vida particular e que isso não havia sido legal. Luiz disse que ele estava enganado, que tudo que a empresa havia levantado era público, afinal tinha por base os registros e rastros que o próprio candidato havia deixado na web. O candidato se sentiu punido injustamente, dizendo que concordava que escreveu algumas coisas inadequadas na rede, mas que estava o tempo todo tentando apenas ser engraçado. Para ele, nada daquilo deveria ser levado a sério, pois havia sido apenas uma brincadeira.
O caso é complexo, apesar de simples. Existe uma distância enorme de percepção entre o que a empresa e Eduardo pensam. Para a companhia, o caso é grave, pois Eduardo é bom profissional, porém com questionável comportamento pessoal. Para o candidato, aquilo tudo na web era só uma brincadeira sem importância. O caso acima é verdadeiro. Obviamente que todos os nomes foram trocados. Situações como essa devem estar ocorrendo aos montes dentro das empresas.
Uma pesquisa conduzida pela Robert Half em 2011 mostrou que 44% das empresas brasileiras usam redes sociais para avaliar candidatos. 39% delas afirmam que falariam com o candidato antes de decidir sobre a contratação. Mas, o dado que mais me chamou a atenção foi saber que 17% das empresas brasileiras disseram que não deixariam de contratar um candidato com ótimo currículo devido a alguma informação negativa ou foto inadequada em seu perfil no Facebook, Twitter ou Orkut. Essa pesquisa ouviu 2.525 profissionais de 10 países. O Brasil e a Itália aparecem na pesquisas como as nações em que os empregadores são mais influenciados pelas redes sociais na hora da contratação.
Acredito fortemente que os currículos, como conhecemos hoje, estão com os dias contados. Num curto espaço de tempo, os recrutadores vão obter os perfis dos candidatos diretamente na web, analisando os rastros e comportamento deles na internet de maneira muito mais rigorosa e profissional do que fazemos hoje. Sistemas e ferramentas de análises de dados cada vez mais sofisticados estão ficando disponíveis e serão usados para isso. Aliás, isso já está acontecendo, mas o processo vai se acelerar e será dominante nos próximos anos. Não tem como escapar. Portanto, cada um de nós deveria traçar uma estratégia de presença na rede, ali é um arquivo vivo de nossas preferências, valores e crenças. E, atenção, tudo que a internet capturar, não dá para apagar.
Texto publicado no Estadão em 19/08/2012
16 comentários:
Matéria interessante, mas... No meu caso por exemplo não poderei ser contratado, pois não tenho Facebook, Não tenho Twitter, Não tenho Orkut, Mal tenho um Linkedin, como estou praticamente fora da WEB e o recrutador não vai achar meus "rastros" eu não poderei ser contratado, alias, nem vou ser cogitado, uma vez que o Curriculo não serve para mais nada ?
Vamos pensar bem, onde termina o Pessoal e Começa o Profissional ?
Moralista demais isso, não? Querem contratar supostos santos que não bebam ou tenham uma vida pessoal livre? Claro que condutas criminosas em redes sociais seriam mesmo preocupantes - como racismo, apologia a crimes, etc.
As redes sociais permite que a gente ouça as conversas de botequim de todos. Divertido. Talvez até prudente para uma empresa, mas me parece assustador quanto tanto moralismo é usado para julgar um profissional. Somos todos humanos, afinal. Seria melhor contratar robôs nesse caso - eles são sempre moralmente corretos.
Não admitiríamos que uma empresa deixassem de contratar alguém por sua orientação sexual - porque isso diz respeito a sua vida pessoal e nada implica em seu desempenho como profissional. Isso é, ninguém tem nada a ver com isso. Então, também não seria razoável que uma empresa deixasse de contratar um profissional por sua vida pessoal.
OH MEU DEUS ELE BEBE ÁLCOOL NA BALADA!!!! Como podemos contratar alguém com tamanha falha de caráter?
Fora o título sensacionalista (as primeiras linhas já deixam claro que o recrutador só foi vasculhar o perfil pessoal do candidato depois de verificar que ele tinha um currículo exemplar), a única coisa que eu consegui concluir desse texto foi que a empresa perdeu um possível ótimo profissional por um critério totalmente sem embasamento.
Trabalhei durante muitos anos em Seleção - tanto em empresas, quanto em consultorias.
E vi, com o passar desse tempo, como os métodos para avaliar candidatos foram perdendo a metodologia científica, e se apoiaram cada vez mais em pseudo-ciência ou deturpação da ciência.
Testes de seleção, apoiados em bases estatísticas rigorosas, foram simplificados, "acochambrados", aplicados e finalmente interpretados por pessoas sem a qualificação necessária.
Dinâmicas de grupo e provas situacionais, com a intenção de verificar a capacidade de indivíduos em lidar com trabalho em equipe ou situações complexas, tornando-se verdadeiras "Olimpíadas do Faustão", às vezes expondo profissionais ao ridículo.
Entrevistas de seleção, de perguntas sagazes para explorar e realmente conhecer o indivíduo, a um questionário infindável de "pegadinhas", parecidos como o de revistas de adolescentes.
As ferramentas sociais são excelentes formas de se conhecer candidatos e profissionais, mas, quem está usando? Será que saberá interpretar esses dados?
Da maneira que está, cada vez mais parece uma imitação barata da piada clássica do português que aprendeu no Brasil a “lógica do aquário”.
Uma pena.
Acho que há muita superficialidade e irresposnabilidade no uso de tais plataformas como forma de avaliação de candidatos. É natural que haja por viéses derivados de heuristicas que são usadas como o exemplo do posto bem mostra. Ha vies de representatividade (tem foto dele bebendo entao deve ser um bebado) e vies de disponibilidade de informações (de uma olhada no trabalho de Kahneman sobre isso)
Se o critério de seleção desta empresa leva em consideração o comportamento dos candidatos nas redes sociais , entendo que seria no mínimo mais elegante desta empresa fazer essa pesquisa antes mesmo de chamar o candidato para uma entrevista pessoal .
Acho que esse tipo de analise é um tanto quanto superficial e passível de ter um indice de erro tremendo no que tange julgar um candidato. Para começar há dois vieses fortes atuando (que se aplicam também na analise do CV somente). Vies da representatividade e viés da disponibilidade de informações. Veja traablho de Daniel Kahneman sobre heuristicas.
Acho que esse tipo de analise é um tanto quanto superficial e passível de ter um indice de erro tremendo no que tange julgar um candidato. Para começar há dois vieses fortes atuando (que se aplicam também na analise do CV somente). Vies da representatividade e viés da disponibilidade de informações. Veja traablho de Daniel Kahneman sobre heuristicas.
A sociedade capitalista prega uma coisa que na realidade ela não vive, apenas impõe. A que ponto chegamos? Se é pra jogar o diploma fora então o que fazer na escola, se não nos vai servir de nada mesmo, nem pra garantir um espaço numa boa empresa?
Se é pra jogar o currículo fora então pra que ir pra escola?
Acho interessante a ideia de conhecer o candidato a fundo visitando, inclusive, suas páginas de redes de relacionamentos na web. Não trata-se de moralismo e sim de adequação, pode ser que a empresa citada não quisesse ter um candidato que frequentasse lugares como a balada. Talvez o dono ou gerente não confiassem sua empresa a "baladeiros", eles têm suas razões. É necessário, porém, que as empresas tenham o máximo de cuidado possível para não fazer julgamentos sem base. Seria mais importante sentar e conhecer o candidato numa conversa apertada do que lê-lo numa foto ... Neste caso um famoso dito popular toma sentido oposto para nos dizer que "mil palavras valem mais do que uma imagem."
O que incomoda nisso tudo para mim é somente uma coisa: as empresas, a cada dia que passa, estão exigindo mais e pagando menos. Chafurdam tudo, procuram razões ridículas para desclassificar candidatos. Como li em um comentário, elas querem contratar santos. Faça-me o favor. Como dito no enunciado da matéria: "jogue fora o seu currículo, ele não serve para mais nada" e procure algum QI (quem indica), de preferência aquele bem influente que o colocará em qualquer empresa e/ou órgão público, com apenas um chavão: "você sabe com quem está falando? Contrata e pronto!!!". Se você não tiver um desse tipo, procure. Vale a pena!
O que incomoda nisso tudo para mim é somente uma coisa: as empresas, a cada dia que passa, estão exigindo mais e pagando menos. Chafurdam tudo, procuram razões ridículas para desclassificar candidatos. Como li em um comentário, elas querem contratar santos. Faça-me o favor. Como dito no enunciado da matéria: "jogue fora o seu currículo, ele não serve para mais nada" e procure algum QI (quem indica), de preferência aquele bem influente que o colocará em qualquer empresa e/ou órgão público, com apenas um chavão: "você sabe com quem está falando? Contrata e pronto!!!". Se você não tiver um desse tipo, procure. Vale a pena!
Olá, estava pensando aqui com meus botões... será que os candidatos também estão vasculhando as empresas nas redes sociais para escolherem onde querem trabalhar? Comentários de clientes, de funcionários sobre a política da empresa etc... acho justo que isso aconteça, afinal a relação empregado-empresa tem que ser de TROCA... do jeito que muitos falam parece q que a empresa é a senhora feudal e o funcionário o coitadinho que não pode errar... devemos lembrar que ambos sermpre terão suas fraquezas... e que o mais importante é o laço que os unem (valores, política,sonhos)... abs!!
Mari. Aposto que sim! Obrigado por comentar no blog. Abcs. Mauro.
Mari. Aposto que sim! Obrigado por comentar no blog. Abcs. Mauro.
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